31 de Out de 2020 - 3 min

Pesquisadores sugerem que tumores de baixa malignidade não sejam mais chamados de ‘câncer’

O termo, muitas vezes inconsistente com a ciência moderna, pode levar a excesso de tratamentos e aumento da angústia por pacientes.
Pesquisadores sugerem que tumores de baixa malignidade não sejam mais chamados de ‘câncer’

Recentes avanços na medicina vêm alterando a denominação de alguns tumores de baixo risco.


Pesquisa publicada no British Medical Journal (BMJ) sugere que alguns tumores que não seguirão se desenvolvendo, ou ainda cujo crescimento ocorre tão lentamente que não chegarão a oferecer risco de vida, mesmo que não sejam detectados, não devem mais ser denominados ‘câncer’. 

De acordo com os pesquisadores, isso inclui subtipos de baixo risco de câncer papilar de tireoide, câncer de próstata localizado e anormalidades celulares encontradas em exames de Papanicolau.


Esta alteração na denominação está relacionada à evidências de que descrever tumores de baixo risco como "câncer" pode levar à angústia e ansiedade do paciente, bem como ao chamado ‘overdiagnosis’, que é o diagnóstico que, embora correto, é desnecessário, oferecendo maior potencial de causar danos do que benefícios. 


Para a Profa. Dra. Kirsten McCaffery, da Universidade de Sydney, na Austrália, uma das autoras do estudo, é importante reconhecer estes tumores de baixo risco, bem como promover o debate entre médicos e cientistas para alcançar soluções satisfatórias.

Segundo depoimento do Dr. Otis Brawley, diretor médico e científico da American Cancer Society, ao MedPage, entre 15% e 25% dos cânceres de mama provavelmente jamais levarão à morte da paciente. Isso porque, alguns destes tumores jamais cresceria e se desenvolveria muito além do estágio em que estava no momento do diagnóstico. Afirmou, ainda, que alguns tumores poderiam, inclusive, por falta de suprimento adequado de sangue, reduzir até desaparecer. 


O diagnóstico de câncer ao longo da história 


Do ponto de vista epidemiológico com perspectiva patológica, o termo "câncer" data de 1853, quando o patologista alemão Rudolf Virchow pela primeira vez descreveu um câncer de mama. Também pode, na época, identificar a sua propagação por todo o corpo por meio de microscópios primitivos e luz de velas.


Hoje, com a modernização das técnicas de imagem, é possível detectar um tumor de mama do tamanho de uma ervilha e realizar o mesmo tipo de análise realizado em 1853. A diferença, além dos microscópios muito mais modernos e da luz elétrica, é que, naquela época, o tumor só poderia ser detectado se fosse enorme. 


De lá para cá, segue denominado como câncer toda vez que um tumor é detectado, seja na tiroide, na mama ou na próstata. E assim, imediatamente presume-se que, se nada for feito, assim como matou em 1853, vai matar em 2018.


O conceito de câncer 


O conceito de renomear tumores de baixo risco não é novo. Há mais de 20 anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a International Society of Urological Pathologists renomearam alguns tumores de bexiga de baixo risco como "neoplasia urotelial papilar de baixo potencial maligno". Uma terminologia semelhante foi adotada para anormalidades celulares de baixo risco identificadas por exames de Papanicolau.


Para facilitar o progresso na retirada do rótulo de ‘câncer’, os autores do estudo sugerem que os médicos e outros clínicos realizem discussões sobre doenças benignas/de baixo risco com pacientes e forneçam informações sobre os verdadeiros riscos associados às doenças. Também é importante trabalhar para conscientização pública sobre o assunto. 


No futuro, com a adoção de termos alternativos para doenças de baixo risco, será possível avaliar as mudanças ocorridas nos pacientes que recebem estes diagnósticos, quantificando os resultados em longo prazo com o manejo menos invasivo de doenças de baixo risco.

Para os pesquisadores, embora possivelmente o assunto crie controvérsias e leve tempo até que seja adotado, ajudará a garantir cuidados adequados e baseados em evidências aos pacientes.  


Estudo completo disponível para assinantes aqui.


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